terça-feira, 27 de outubro de 2015

Catequese, caráter e cultura - Parte II

  Matheus Viana

Manassés também “Reconstruiu os altares idólatras que seu pai, Ezequias, havia demolido...”. Basta lermos o livro de Atos ou estudarmos a História da Igreja para ver como ela agiu em seus primórdios, a fim de detectarmos a abismal distância a qual nos encontramos. Basta visitar o facebook para ver os altares da egolatria erguidos em meio à cristandade pós-moderna. E os “artistas gospel”? E os empresários da fé, ministros que fazem do chamado divino uma oportunidade para comercializá-lo? Tornam-se “astros do púlpito”, com venda de ingressos antecipados e tudo.
    
Outro altar é o da doxolatria (adoração à doutrina). Vemos um notável levante de defensores de certas doutrinas que usam – e abusam – dos meios tecnológicos e sociais para difundirem os preceitos da doutrina da qual são devotos, e não do Evangelho (legado de Jesus Cristo). O número de denominações divididas por conta do acirramento, por exemplo, entre calvinistas e arminianos é preocupante. No ímpeto pela ortodoxia, a doutrina, independente qual seja, tem ocupado a supremacia do próprio Cristo no coração de muitos. Altar que deve ser derrubado.
    
Manassés também edificou altares a Baal e um poste sagrado – também conhecido como poste-ídolo – para Aserá, deusa cananeia da fertilidade, também chamada de Astarote. Os cultos a este ídolo eram realizados com orgias, onde as sacerdotisas tinham relações sexuais com os que a cultuavam (Cf. Levítico 25:1-18). Em outras palavras, era um culto à imoralidade sexual. A Palavra utilizada pelos escritores do Novo Testamento, traduzida por imoralidade sexual e também por adultério, é pornéia, de onde se deriva a expressão pornografia. Pornografia, na verdade, é a descrição de qualquer tipo de sexualidade ilícita. A ela, o escritor Marquês de Sade (1749-1814) dedicou sua vida e, com isso, colaborou de forma significativa com a degradação da cultura ocidental. Quando deixamos que a imoralidade sexual nos domine, independente da forma em que ela se manifesta em nós, estamos cultuando Astarote. Ou seja, erguendo um altar a ela em nosso coração, que é o Templo do Espírito Santo (I Coríntios 6:19).

Além de tudo isso, Manassés realizou um equívoco significativo: “Construiu altares no templo do SENHOR, do qual este havia dito: ‘Em Jerusalém porei o meu nome.’” (II Reis 21:4). Deus estabeleceu este decreto aos hebreus, antes de entrarem em Canaã, como parte de Sua ética a eles:

“Estes são os decretos e ordenanças que vocês devem ter o cuidado de cumprir enquanto viverem na terra que o SENHOR, o Deus de seus antepassados, deu a vocês como herança. Destruam completamente todos os lugares nos quais as nações que vocês estão desalojando adoram os seus deuses, tanto nos altos montes como nas colinas e à sombra de toda árvore frondosa. Derrubem os seus altares, esmigalhem as suas colunas sagradas e queimem os seus postes sagrados; despedacem os ídolos dos deuses e eliminem os nomes deles daqueles lugares. Vocês, porém, não adorarão ao SENHOR, o seu Deus, como eles adoram os seus deuses. Mas procurarão o lugar que o SENHOR, o seu Deus, escolher dentre as tribos para ali por o seu Nome e a sua habitação.” (Deuteronômio 12:1-4).

Quando Davi expressa a Deus seu desejo de construir um lugar para Sua habitação em meio ao Seu povo, Deus lhe disse através do profeta Natã: “Será ele (Salomão) quem construirá um templo em meu nome.” (II Samuel 7:13). E este templo foi construído em Jerusalém. O decreto descrito em Deuteronômio teve como base os Dez mandamentos, que foram o reestabelecimento – não em seu caráter pleno – do culto racional do homem a Deus, seu Criador, onde Ele deveria ser adorado única e exclusivamente (Êxodo 20:1-11). Consequentemente, tal devoção seria a base para a vida em comunidade (Êxodo 20:12-17). Assim, vemos que a devoção que Deus espera que ofereçamos a Ele seja exclusiva, santa (kadesh, consagrada/sem mistura). Pois é esta a expressão que deveria ser gravada no diadema do sacerdote (Êxodo 28:36): Santidade ou Consagrado (Kadesh) ao Senhor (Adonai).
    
Por O nome de Deus significa que o objeto que O leva pertence a Ele. Manassés usou, indevidamente, algo que não lhe pertencia de modo que desagradou profundamente O proprietário. Refletindo sobre isso, não há como não evocarmos o episódio quando Jesus chega ao templo de Jerusalém e encontra cambistas. As palavras de Jesus emitem uma severa mensagem: “Não está escrito: ‘A minha casa será chamada casa de oração para todos os povos? Mas vocês fizeram dela um covil de ladrões.’” (Evangelho segundo Marcos 11:17). A ira de Jesus, resultado de uma profunda indignação – que não anulou o exercício de Sua razão -, paira sobre Sua Igreja. Manassés construiu altares aos deuses pagãos, assim como os homens dos tempos de Jesus construíram altares à egolatria, assim como muitos nos dias atuais.
    
Jesus subiu a Jerusalém por estar próximo da Páscoa. Ocasião propícia para os judeus devotos realizarem os sacrifícios ordenados por Moisés. Por estarem debaixo do jugo romano, muitos tiveram que usar seus animais como pagamentos de tributos ao imperador. Por isso, tinham que comprar o animal a ser sacrificado conforme a Lei ordenava. Ao entrar no templo, Jesus encontrou um verdadeiro comércio do culto. Embora usem métodos diferentes, os mercadores da fé agem à semelhança dos que Jesus expulsou (Evangelho segundo Marcos 11:15-16).


Ele não tolerou, assim como não podemos tolerar, a comercialização da fé através da teologia da prosperidade, do mercado gospel e da grande variedade de visões e estratégias que utilizam métodos corporativos para fazer da Igreja um mecanismo lucrativo. Tanto é que muitos já não se indignam ao ouvir o chavão: Igreja é empresa. Não. Segundo Jesus, o líder supremo da Igreja, Ela é a Casa de Oração. Ou seja, lugar onde Ele – somente Ele – é cultuado. Não é mais um lugar geográfico nem físico. Mas a comunidade dos regenerados que O adoram em espírito e em verdade (Evangelho segundo João 4:23), onde Ele habita e através de quem governará sobre a terra (Efésios 2:22, Evangelho segundo Mateus 16:18).



Continua...

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