quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Ensaios sobre o mal - Parte III

Matheus Viana

Mas há os que questionam: “E o mal que assola pessoas inocentes? E quando pessoas boas sofrem de câncer, por exemplo? E uma criança que nasce debaixo do veredicto de uma enfermidade?”. Para indagações como estas há apenas uma resposta: Não há ninguém que seja inocente. O apóstolo Paulo elucida que todos pecaram (Romanos 3:23) e que, por isso, não há um justo sequer (Romanos 3:10). Jesus certa vez afirmou ao jovem rico que o abordara: “Não há ninguém que seja bom, a não ser somente Deus.” (Evangelho segundo Lucas 18:19).

Analise o comportamento de uma criança qualquer! Desde a tenra idade, mesmo sem a consciência plena de sua existência e da vida de forma geral, ela age de forma egoísta. Ou seja, pratica – ainda que de forma instintiva – o mal. Pois todo ser humano já nasce debaixo da regência do pecado. O salmista preconiza: “Em iniquidade fui formado, e em pecado me concebeu minha mãe.” (Salmos 51:5).

O ser humano pratica o mal no exato momento em que abandona o Bem supremo, que é Deus e, portanto, pode vir apenas dEle. Na teologia judaico-cristã, quando estudamos os atributos de Deus, os comunicáveis e os incomunicáveis, vemos dois tipos de santidade: kadesh e kadosh. A que Deus comunica ao ser humano, e consequentemente deseja que ele viva, é Kadesh. Já a santidade que pertence somente a Deus, que significa a plena ausência do mal, é Kadosh.

Os apóstolos, ao chamarem os crentes de “santos”, estavam falando do primeiro tipo (kadesh) e em seu primeiro estágio: separados. Ou seja, separados de toda ação e padrão ético provenientes dos pensamentos contrários à Palavra de Deus (Romanos 12:2, II Coríntios 4:4) para começarmos a nos santificar até atingirmos a estatura do varão perfeito (Efésios 4:13). O apóstolo Tiago afirmou ao ensinar sobre o ciclo do mal: “Quando alguém for tentado, jamais deverá dizer: ‘Estou sendo tentado por Deus’. Pois Deus não pode ser tentado pelo mal e a ninguém tenta.” (Tiago 1:13). Deus não pode ser tentado pelo mal porque nEle não há mal algum.

O mal, no entanto, não é algo criado. Conforme elucidou Agostinho em seu livro O livre-arbítrio, ele não possui existência própria (ontológica). Nada mais é do que a corrupção (deterioração) do bem. O ser humano se afastou do Bem maior quando abandonou a verdade de Deus e aceitou uma proposta contrária (Gênesis 3:5-8). Sua mente foi contaminada por ouvir um argumento ardiloso.

Com a mente contaminada, seu coração foi corrompido. Consequentemente, suas ações também foram. Por isso o apóstolo Paulo adverte: “O que receio, e quero evitar, é que assim como a serpente enganou Eva com astúcia, a mente de vocês seja corrompida e se desvie da sincera e pura devoção a Cristo.” (II Coríntios 11:3).

O registro de Gênesis diz: “O Senhor viu que a perversidade do homem tinha aumentado na terra e toda inclinação dos pensamentos de seu coração era sempre e somente para o mal.” (Gênesis 3:6). Tal fato foi desdobramento do ser humano ter se apartado do Bem Supremo devido ao uso indevido da liberdade que lhe foi concedida.

O veredicto que recebeu como consequência de sua escolha foi completo, ou seja, não atingiu apenas o ser humano, mas toda a natureza: “Visto que você deu ouvidos à sua mulher e comeu do fruto da árvore da qual ordenara que não comesse, maldita é a terra por sua causa.” (Gênesis 3:17). O universo entrou em colapso. Desastres naturais como terremotos e tsunamis, por exemplo, são desdobramentos deste fato.

Contudo, assim como o ser humano é responsável pelo mal que existe no mundo (Romanos 5:12), é também de nossa inteira responsabilidade aplacarmos o mal que seja possível. O filósofo britânico Edmund Burke preconizou: “para que o mal vença, basta que o bem não faça nada”. O apóstolo Tiago, no entanto, milênios antes, advertiu: “Aquele que sabe fazer o bem e não o faz, nisso peca.” (Tiago 4:17). Tal advertência é baseada nos ensinamentos de Jesus: “Assim, em tudo, façam aos outros o que vocês querem que eles lhes façam.” (Evangelho segundo Mateus 7:12).

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