sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Está Escrito


A ‘logos’ que vence a tentação

Matheus Viana

Introdução

Um dos principais diálogos registrados nas Escrituras é o narrado por Mateus entre Jesus e Satanás (Evangelho segundo Mateus 4:1-11). Nele podemos conferir que a vitória de Jesus foi pavimentada tanto pelo aspecto espiritual (sobrenatural) quanto pela razão (intelectual). Simplesmente incrível!

O aspecto sobrenatural – a ação do Espírito Santo em Sua vida – é notório no tocante ao propósito que O levou a ser conduzido ao deserto: ser tentado pelo diabo. Sua humanidade seria colocada à prova. Sim, Ele era o Filho do Deus vivo, conforme o próprio Deus havia dito momentos antes na ocasião de seu batismo por João Batista (Evangelho segundo Mateus 3:16) e Pedro, posteriormente, afirmaria (Evangelho segundo Mateus 16:16). Mas ele também é o Deus que se fez homem, ou seja, assumiu a plenitude da forma humana (Filipenses 2:6-8). Resumindo, conforme ficou definido no Concílio de Calcedônia (451 d.C), Jesus era 100% Deus e 100% homem.

Jesus teria que vencer o tentador como homem. Assim, Sua vitória seria plena, a fim de que a profecia de Isaías se cumprisse sobre a humanidade (Leia Isaías 53:5). Era pegar ou largar. Ele enfrentou o desafio e venceu. Contudo, o tentador não parou por ali...

Após a consumação da vitória na cruz, pouco antes de Sua ascensão, Jesus fez pelos Seus discípulos a seguinte oração: “Não peço que os tires do mundo, mas que os livres do mal”. (Evangelho segundo João 17:15). Intercessão emblemática que carrega um propósito: difundir o Evangelho do Reino dos céus a fim de que Ele seja estabelecido sobre a terra, conforme o pedido expresso na oração que, anteriormente, ensinou-lhes a fazer: “Venha a nós o teu Reino, seja feita a tua vontade, assim na terra como nos céus.” (Evangelho segundo Mateus 6:10). Mas, para isso, eles não poderiam cair em tentação.

Não é diferente conosco. Para o êxito desta empreitada é necessário vencermos as tentações do “deus deste século” que cega o entendimento das pessoas para que não lhes resplandeça a luz do Evangelho do Reino dos Céus (II Coríntios 4:4). O tentador aplicou a mesma tática para com Jesus com o intuito de desviá-lo da plenitude do propósito divino. No entanto, Jesus venceu. Já a humanidade tem sucumbido. A causa: mentes “cegadas” – entorpecidas - por suas tentações ardilosas.

Embora tenha sido um desafio de caráter espiritual, Jesus utilizou um arsenal racional. Assim como preconiza a teologia de Agostinho de que a razão é serva da fé, Jesus usou sua razão para estabelecer o poder espiritual que possuía como Filho de Deus. Não foi em vão que Jesus, ao vencer cada tentação que lhe foi proposta, bradou: "está escrito". Não foi meramente uma opção, mas um princípio. Pois, conforme vimos anteriormente, a estratégia que o tentador usa para nos impedir de concluirmos o propósito de Deus sobre a humanidade é a deturpação em nossa mente. Foi desta forma que ele logrou êxito com Eva e Adão no Éden (Gênesis 3:1-6). Corrompeu o entendimento de Eva que passou a pensar de forma contrária aos princípios e propósitos de Deus à sua vida. A desobediência e a consequente queda foram meros efeitos colaterais.

Cada uma das três tentações propostas a Jesus pelo tentador representa um período e também uma teoria filosófica/científica de nossa história. A primeira delas foi a de que Jesus, sentindo fome, transformasse pedra em pão (Evangelho segundo Mateus 4:3). Nesta proposta é clara a ideia de transformar algo duradouro em um suprimento momentâneo.

Esta proposta é feita a nós, além de outras teorias, através do chamado materialismo histórico/dialético. Teoria criada pelo filósofo alemão Karl Marx (1818-1883) que preconiza que a consciência humana é determinada pela ação da matéria sobre a realidade. Consciência, neste contexto, não é meramente a razão do indivíduo, mas sua plena personalidade, considerando que o materialismo de Marx deriva da dialética de outro filósofo alemão, Georg Hegel (1770-1831), que define consciência como a “ideia absoluta”. A diferença é que, enquanto Hegel diz que esta “ideia absoluta” gera a matéria, Marx afirma o contrário: a matéria determina a consciência. Falaremos sobre a origem, o contexto e as implicações sociais do materialismo sobre a humanidade em breve.

A segunda proposta feita pelo tentador a Jesus foi a de que Ele se lançasse da parte mais alta do Templo a fim de ser salvo pelos anjos. Aqui é evidente a ideia da fé inconsequente, ou seja, completamente desprovida de razão. Sim, Jesus poderia pular e, com certeza, seria salvo pelo sobrenatural de Deus. Mas o fato de não ter cedido a esta ardilosa proposta nos deixa uma lição que veremos adiante. 

Esta segunda proposta é feita a nós hoje através do existencialismo, filosofia que apregoa o “salto de fé”. Ou seja, a conduta humana que abandona a razão e que se pauta unicamente pelos seus instintos e impulsos, sentido de sua existência. O filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900) define como ‘falsa moral’ qualquer artifício usado para controlar ou coibir os impulsos e instintos humanos. É a morte da moralidade. Neste mesmo mote, o filósofo francês Jean-Paul Sartre (1905-1980) foi o mentor intelectual da revolução contracultura, em 1968, que apregoou o lema ‘sexo, drogas e rock´n roll’. O que gerou o crescimento vertiginoso da sexualidade juvenil e do consumo de drogas ilícitas. Veremos as implicações do existencialismo e o êxito que o tentador tem conseguido com tal proposta sobre a humanidade em breve.

Já a terceira proposta do tentador a Jesus foi de conceder a Ele todos os reinos do mundo se prostrasse diante de seus pés e o adorasse (Evangelho segundo Mateus 4:9-10). Aqui é clara a ideia de que as riquezas e os poderes deste mundo podem se tornar ídolos aos homens. Realidade que nos enreda. É explícita a tentação de Satanás a nós através da cultura consumista. Se no materialismo histórico/dialético a consciência (personalidade e modo de pensar) do indivíduo é determinada pela ação da matéria sobre a realidade que o cerca, no consumismo é por aquilo que ele pode adquirir e consumir. O ter define o ser. Ambos são deturpações da razão que Deus estabeleceu sobre o homem.

A humanidade tem sucumbido diante destas três tentações disseminadas ao entendimento coletivo: materialismo histórico/dialético, existencialismo e a cultura do consumo (consumismo). O que a tem distanciado do propósito de Deus. É por isso que o apóstolo Paulo adverte: “Transformai-vos pela renovação da vossa mente para que experimenteis a boa, perfeita e agradável vontade de Deus”. (Romanos 12:2).

Analisaremos cada um destes três pontos e depois mergulharemos nos pormenores que Jesus usou para vencer cada tentação que lhe foi proposta. O mesmo Espírito que estava sobre Ele está sobre nós. Que renovemos a nossa mente a fim de sentirmos (Filipenses 2:5), pensarmos (I Coríntios 2:16) e agirmos (I João 2:6) como Ele. Deste modo, a vitória é certa (Romanos 8:37).

Até breve...

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