terça-feira, 10 de julho de 2012

O evangelho pós-moderno

A transformação que o ‘evangelho pós-moderno’ tem difundido é apenas exterior. No entanto, a que Jesus deseja realizar em nós, através de Seu sobrenatural, é interior para depois refletir no exterior.

Matheus Viana

Algo sobre a qual devemos nos debruçar é o conceito do amor incondicional de Deus ao ser humano. Sim, Ele nos ama da maneira que somos e nos recebe em Sua santíssima presença em virtude do precioso sangue de Jesus ter sido derramado em nosso favor. Portanto, pautado neste amor, está a nossa transformação.

Paulo é explícito ao orientar: “Aquele que está em Cristo nova criatura é”. (II Coríntios 5:17). Esta transformação não é instantânea. É paulatina, processual, de Glória em Glória (II Coríntios 3:18). Resumindo, a salvação de Deus ao homem consiste em transformação. É exatamente este o elemento que tem sofrido uma severa relativização. O que tem causado a deturpação no caráter do Evangelho.

A transformação que o ‘evangelho pós-moderno’ tem difundido é apenas exterior. “Venha para Jesus e o milagre que você tanto espera será realizado. Sua cura física se manifestará e sua vida social e financeira terá um considerável ‘up grade’. Venha para a campanha dos milagres e sua vida nunca mais será a mesma”. Isso mesmo! O Evangelho da cruz tem sido reduzido ao ‘evangelho autoajuda’.

Apenas para constatar, o conceito de autoajuda, como a própria semântica da expressão já diz, trata-se de uma nomenclatura “politicamente correta” para egoísmo. Uma das necessidades básicas do ser humano, segundo o psicólogo Abraham Maslow, é o relacionamento social. Para desfrutarmos de um relacionamento social e afetivo satisfatório, o elemento ‘amor’ – em suas diversas vertentes - deve estar presente.

Jesus, sintetizando toda a Lei e os Profetas, disse certa vez: “Amarás o Senhor seu Deus de todo coração, de toda alma e de todo entendimento. E o outro semelhante a este é: amarás o teu próximo como a ti mesmo”. (Evangelho segundo Mateus 22:37 e 39). Vemos então que o amor se dá em três níveis: a Deus, ao próximo e, em último lugar, a si mesmo. Foi esta tríade, exatamente nesta ordem, que pavimentou a obra de Jesus na cruz.

O exercício da autoajuda, no entanto, inverte esta ordem. Em muitos casos, o amor a Deus e ao próximo nem são cogitados. Baseado no “prazer a qualquer custo” de Epicuro, o meu bem-estar é o que importa. Comportamento chamado pela psicologia de egocêntrico. É este, infelizmente, o caráter que fundamenta o evangelho pós-moderno. Jesus não passa de mero instrumento para a transformação exterior – o dito milagre ou transformação - a fim de que esta necessidade de autoajuda seja suprida.

Ao meditarmos nas Sagradas Escrituras, vemos que a transformação que o Evangelho de Jesus realiza é interior e reflete no exterior. Ou seja, a cura física, a restauração familiar, a obtenção de um emprego e a ascensão social são resultados, e não as causas. A mulher siro-fenícia provou da libertação sobrenatural em sua filha por ter seu coração transformado pelo quebrantamento. Seu orgulho foi provado até as últimas consequências (Evangelho segundo Mateus 15:21-28). Na contramão, muitos em nossos dias abandonam a fé por um tratamento - leia-se discipulado -  muito menos severo. Se o milagre exterior não acontece, não há motivo para se relacionar com Deus.

O filho pródigo, conforme vimos no texto anterior (A verdadeira “escada do êxito"), saiu do caos ao qual vivia por nutrir a consciência – algo interior – de que não poderia viver longe da presença de seu pai. Sim, apenas ele poderia oferecer vida abundante. Acho interessante a fala do jovem ao pai: “Já não sou digno de ser chamado teu filho; faze-me como um dos teus servos”. (Evangelho segundo Lucas 15:19).

Quanta diferença! Templos evangélicos estão lotados de pessoas buscando – e muitas vezes exigindo – o milagre exterior. E o que é pior, este tipo de desejo é fomentado nos púlpitos. O arrependimento do filho pródigo e sua consequente conversão foram ações resultantes da transformação interior que experimentou. Ao chegar ao seu pai, sem lhe exigir nada – importante que se diga -, recebeu roupas novas. Isso fala de justificação. Recebeu um anel, símbolo de que era pertencente à família de seu pai.

O apóstolo Paulo ensina que o Espírito Santo é o selo de nossa redenção (Efésios 4:30). É Ele que testifica de que somos filhos de Deus e nos faz co-herdeiros, com Cristo Jesus, de Sua vida abundante em todas as áreas (Romanos 8:16-17). Esse é o maior milagre que alguém pode receber: o Espírito Santo, a essência do próprio Deus, habitando em nós (I Coríntios 3:16).

Além de roupas novas e um anel, o filho pródigo também recebeu sandálias novas. Transformação consiste em um novo caminhar. Muitos recebem o milagre e têm suas vidas mudadas, mas ainda continuam trilhando caminhos contrários aos de Deus. Uma cura física, por si só, não tem o poder de conversão. É possível alguém ser curado e ainda permanecer em pecado – errando o alvo. Fato que permeia a atual realidade da Igreja.

Que nos arrependamos a fim de desvencilharmos deste evangelho pós-moderno e convertermos de nossos caminhos. Corramos a carreira que nos está proposta: a transformação interior, a fim de que atinja o nosso exterior e todos ao nosso redor saibam que Jesus não apenas cura ou prospera, mas salva e faz do indivíduo nova criatura (Hebreus 12:1). Muito mais do que isto. O faz ser e viver à imagem e conforme à semelhança de Jesus Cristo (Romanos 8:29, Filipenses 4:13). Esse é o alvo que a transformação oriunda da Graça incondicional quer nos conduzir. 

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